O CORPO FALA

Matéria de Ivonete Lucirio, publicada na revista Bons Fluídos

Nosso organismo carrega muito mais sabedoria do que podemos imaginar. Ele dá sinais quando algo não vai bem.

 

Existe algo mais íntimo para você do que seu próprio corpo? Afinal, estão juntos as 24 horas do dia desde que você nasceu. Ainda assim as pessoas se esquecem de prestar a devida atenção nele. Muitas vezes o organismo dá sinais óbvios de que as coisas não vão bem, ou de que ele precisa de algo e, simplesmente, é negligenciado. Uma pena. Várias receitas médicas poderiam ser economizadas… Mas, dá para entender. Afinal, numa época em que há tanta tecnologia disponível para tornar nossa vida mais fácil e detectar tudo – há até um aplicativo para iPad que armazena dados sobre a pressão arterial e gera estatísticas –, qual a vantagem de ouvir o que o corpo fala? Há tantos tradutores para ele. Só que “essas ferramentas” nem sempre acertam – ou são tão precisas assim.

Talvez seja a hora de você começar a reparar nos sinais que seu organismo envia. E não estamos falando de sintomas claros, como a dor – lógico que, se ela existe, é um indício de que pode haver algo errado com você. Porém, as mensagens podem ser mais sutis.

Ao nascer, os sinais do organismo representam a única forma que o bebê tem para se expressar. “As manifestações corporais, sensoriais, motoras e os sintomas somáticos são, para o pequeno, as primeiras e exclusivas vias de comunicação, uma vez que ele ainda não dispõe de palavras para esse fim”, diz o psicanalista Rubens Marcelo Volich, professor do curso de psicossomática do Instituto Sedes Sapientiae, em São Paulo. À medida que cresce, outras possibilidades, mais simbólicas, como a linguagem, o pensa- mento, os sonhos, vão ganhando cada vez mais espaço nas trocas e vivências humanas. “Mas elas guardam, para sempre, suas raízes e relações com as primeiras experiências corporais, da infância”, afirma Volich.

“Para entender o que o corpo quer dizer é preciso diminuir o ritmo do dia a dia, evitar o acúmulo de atividades e buscar momentos de tranquilidade.”

 A regra 7-38-55

O estudo da estrutura corporal como uma importante ferramenta de expressão vem da década de 60. Ele surgiu com base nas pesquisas do professor de psicologia Albert Mehrabian, da Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos. Na época, ele realizou uma série de investigações para identificar como era feita a comunicação entre as pessoas. Foi quando criou a regra 7-38-55. Essa lei diz que 7% da mensagem é transmitida por meio de palavras; 38%, pelo tom de voz; e 55%, pelos gestos. Ele estava se referindo às pessoas, mas é certo que, desses 55%, uma boa parte trazia mensagens internas para o próprio indivíduo que estava falando. Por exemplo, um ombro arqueado denota desânimo e cansaço, e as dores advindas dessa postura são um forte sinal de que a pessoa está indo além de seus limites, seja no trabalho, na academia, seja em seus afazeres diários.

O comportamento alimentar é uma das formas mais comuns – e talvez mais compreensíveis – de o organismo se expressar. O caso clássico que vem à cabeça é o da gestante. Todo mundo costuma rir dos desejos das grávidas, mas eles têm sabedoria, talvez porque elas vivam um momento de interação especial com o próprio corpo e, por isso, estejam mais atentas ao que ele quer dizer. Claro que a única explicação para o desejo de comer pizza de carambola ou petit gâteau, à meia-noite, é que seja mero capricho. Mas aquela vontade louca de comer frutas azedinhas pode ser um sinal de que está faltando vitamina C para a dupla.

Essa necessidade declarada de determinados alimentos pode aparecer também fora da gestação. “Os melhores exemplos são os comportamentos alimentares bizarros em indivíduos com deficiência de minerais e vitaminas”, diz o imunologista Luiz Vicente Rizzo, do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo. A falta grave de ferro e cobre no organismo pode levar a pessoa a comer terra, por exemplo. Para entendermos, 100 gramas de argila contêm 32% das necessidades diárias de ferro e 70% das de cobre. É claro que aqui se trata de uma carência séria. Você não deve esperar a vontade de comer argila para prestar atenção no que o seu corpo quer dizer.

“Uma alimentação deficiente em vitaminas e minerais resulta em certos sinais. Cãibras podem ser causadas por uma alimentação com pouco cálcio, magnésio e potássio. A falta de magnésio pode gerar fadiga. A palidez da pele, da parte interna dos olhos e da gengiva, pode ser falta de ferro”, afirma a nutricionista Natália Dourado, da Clini Beauty Nutrition, em São Paulo. “Mas é importante não confundir vontade pura e simples com necessidade fisiológica”, diz ela. Um pedaço de pizza transbordando de queijo, arrematado com uma barra de chocolate, tem mais a ver com gula.

Para além da fome

As indicações passadas pelo organismo não se limitam ao apetite por coisas bizarras ou por um simples kiwi, rico em vitamina C. O período de sono também manda sinais, seja por meio dos sonhos (veja o quadro) , seja por sua pobre qualidade. Grande tensão e irritabilidade podem ser mostras de que alguma coisa não vai bem com o travesseiro. “Lapsos de memória em pessoas jovens também podem denotar sono de má qualidade”, diz o neurologista Geraldo Rizzo, do Sonolab, em Porto Alegre, Rio Grande do Sul. E, assim como o corpo indica quando a pessoa não está dormindo bem, ficar de mal com os lençóis desencadeia doenças que não têm relação direta com eles. Uma pesquisa realizada pela Universidade Federal de São Paulo, divulgada em outubro, mostra que uma noite em claro deixa o corpo mais suscetível a inflamações e infecções. Segundo o estudo, passar noites sem dormir leva a um crescimento da quantidade de glóbulos brancos – células de defesa do organismo – circulando no sangue. O aumento indica que o corpo está lutando contra algum agente invasor que, provavelmente, em situação de calmaria, não provocaria reação no organismo.

Essa pesquisa vem fazer coro com outras que indicam que o sistema imunológico sofre sempre que a pessoa está sujeita a muito estresse. A resposta hormonal a situações de pressão altera o funcionamento do sistema imunológico e deixa a pessoa mais apta a adquirir infecções. É o caso da gripe sucedida por uma conjuntivite, que resulta em três dias de diarreia. Aqui, o sinal é claro: se a pessoa não parar por si, seu corpo fará isso por ela.

Muitas vezes não conseguimos captar essas mensagens, por mais óbvias que sejam. “Ou então nem sempre estamos dispostos a levá-las a sério, principalmente se elas implicam abrir mão de algumas coisas. Muitas pessoas percebem que seria conveniente diminuir o ritmo do trabalho, mas se recusam a fazê-lo”, diz o psicanalista e psiquiatra José Atílio Bombana, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). “Para entender o que o corpo quer dizer é preciso ter momentos de tranquilidade, sem muita atividade”, afirma.

Mas não fique procurando problema onde não existe. “Há pessoas extremamente atentas a todas as alterações do organismo, sempre buscando algo errado. São os hipocondríacos”, diz o psiquiatra. Para esses, qualquer tremor nas mãos é mal de Parkinson. No entanto, não podemos ficar cegos aos sinais de desequilíbrio, muitos deles recorrentes, que persistem por anos. O ideal, como quase tudo na vida, é um ponto de equilíbrio. “Não dá para sobrevalorizar nem para subvalorizar o que seu corpo tem a dizer”, afirma Bombana.

Preste atenção

Conheça algumas das mensagens mais características que seu corpo envia.

  • Se você tem cãibras: pode ser sinal de falta de magnésio e de potássio na alimentação.
  • Se você sente muito cansaço: pode ser sinal de deficiência de ferro ou hipotireoidismo.
  • Se você tem queda de cabelos e unhas quebradiças: pode ser sinal de carência de vitaminas, principalmente as do complexo A e B.
  • Se você apresenta rouquidão constante: pode ter problemas na laringe.
  • Se o seu suor tem um odor diferente: pode ser sinal de diabetes ou doença do fígado.
  • Se sua pele está oleosa demais: pode ser problema nos ovários.
  • Se você tem lapsos de memória: pode ter apneia ou outro distúrbio ligado ao sono.
  • Se você tem gripes frequentes: pode estar com o sistema imunológico comprometido.
  • Se a mucosa interna de seus olhos ou a gengiva estão com a coloração esbranquiçada: pode ser sinal de carência de ferro.
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